segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Primeiro Tratamento

Depois do choque da notícia que faria minha vida dar um giro de 180°, era hora de agir... e agir rápido. A consulta com o oncologista seria a porta de entrada para um mundo totalmente desconhecido para mim, afinal, sempre fui saudável, forte, resistente. Mas o diagnóstico de um câncer apaga todo seu passado de saúde inabalável e o coloca numa instabilidade tão grande que, ao menor sopro, você desaba. Encarei uma maratona de exames, fiz muito jejum, tomei litros de contraste e comecei a viver um dos maiores dramas que se segue ao diagnóstico: a possibilidade de metástases. A essa altura, todo mundo já se preocupava com meus pulmões, um dos sítios "preferidos" para disseminação do tumor, e também com os outros ossos. Todavia, os exames de imagem não evidenciaram nenhum ponto suspeito e, nessa hora, já comemoramos a primeira vitória. Ufa! O tratamento começaria com uma cirurgia, seguida de radioterapia. Falando assim, parece tão fácil, tão rápido, tão tranquilo... mas viver isso tudo sendo o protagonista da história muda as perspectivas de qualquer um. A primeira visita ao cirurgião de cabeça e pescoço foi traumatizante. Penso que a medicina existe não só para salvar vidas, mas para dar conforto até mesmo nas situações mais desconfortantes. Um médico não tem somente a missão de curar, mas de, pelo menos tentar compreender a dor de quem está do lado oposto da mesa. Tem o dever de consolar. Minha experiência com o cirurgião foi péssima, vocês já devem ter notado. Mas não quero me deter a isso nesse momento. É pequeno demais. Fomos, então, para Belo Horizonte, em busca   do melhor tratamento e do médico que despertasse pelo menos minha simpatia para, mais tarde, ganhar minha confiança. E assim foi. Operei no Hospital das Clínicas, sendo que a cirurgia durou 13 horas e me custou metade da mandíbula e um pedaço da fíbula para reconstrução. Além disso, 40 dias de internação, infecção da prótese, restrição alimentar, limitação de movimentos da perna, drenos e para fechar com chave de ouro, uma sonda nasogástrica. Quem já usou me entende. É o ó. Depois dessa quaresma no hospital, finalmente voltei para casa, sem a sonda (uhuuu), podendo comer alimentos mais pastosos, mas com algumas restrições ainda... mas pergunta se reclamei. Nana nina não. Depois de uma experiência dessa, não é tudo que tem o poder de te deixar um reclamão de primeira. Os primeiros dias após a alta foram tranquilos e felizes. Fui para minha cidade ser mimada de todas as formas possíveis, receber muito carinho, várias visitas, telefonemas, presentes. Em pouco tempo a radioterapia começaria e então era preciso aproveitar as "férias". Fiz 30 sessões no Hospital Belo Horizonte. No meio exato do tratamento, minhas mucosas se rebelaram e resolveram se inflamar, me deixando uma semana afastada da radio. Mas, como diz o poeta, no final tudo dá certo. Ou não, contrariando nossos desejos. No dia da última sessão de radioterapia, quando cruzei a porta do hospital, foi impossível não pensar em tudo que tinha acontecido comigo. Um filme passa na sua frente e, às vezes, é difícil descrever até o que sentimos. Alegria por ter terminado? Medo de uma recidiva? Insegurança para voltar à vida normal? Sensação de dever cumprido? Orgulho de ter chegado até ali "inteira"? Não sei. Talvez nunca saberei. Mas, enfim, tinha chegado ao fim o primeiro grande desafio da minha vida...





Bjo, bjo, bjo.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Voltando no tempo...

Julho de 2006. Eu tinha uma vida normal, considerando o conceito de normalidade para a grande maioria das pessoas: morava com meus pais e irmãos, estudava, namorava, planejava um futuro lindo e promissor, tinha saúde e paz. Minha maior preocupação era mesmo com o vestibular e com a famigerada concorrência pela vaga no curso de medicina. Morava em Montes Claros, MG, minha cidade natal, mas estudar em Belo Horizonte era um sonho. Um sonho que se tornaria realidade em breve. No segundo semestre de 2006, eu iria fazer cursinho em BH e um leque de possibilidades se abria na minha frente. Pois bem... faltando pouco para me mudar, resolvi ir ao dentista. Há alguns dias, tinha percebido algo estranho na região da mandíbula esquerda, como se fosse uma "bolinha", imperceptível aos olhares mais desatentos, tão inocente a princípio, bem próxima ao local que corresponde à implantação do siso. Não sentia dor, não havia nenhum inchaço local, nada que chamasse muito a atenção. E então o primeiro raciocínio foi esse: é culpa do dente do juízo. Na ocasião, o dentista pediu uma radiografia para avaliação e planejamento e depois eu faria uma cirurgia para retirada do dente. E eis que a primeira surpresa dessa história apareceu quando as imagens mostraram uma mancha na mandíbula, no meio do osso. "É um cisto. Tiro o siso e esse cisto no mesmo procedimento, ok?". Ok. Mas assim que terminou a cirurgia, vi no dentista um olhar de estranhamento. Resolvemos mandar o material para fazer biópsia, por precaução. Eu mesma busquei o resultado, abri o envelope e li, mas aonde, na minha ignorância, eu poderia imaginar que "a impressão diagnóstica, a príncipio, é de um Sarcoma de Ewing" poderia ser algo tão grave, capaz de mudar minha vida para sempre? Nunca. Estava com tanta pressa naquele dia, arrumando os últimos preparativos para minha viagem, que passei no consultório odontológico e deixei o resultado da biópsia com a secretária. Viajei, sem saber que, naquela mesma tarde, o dentista chamou minha mãe e meu irmão para comunicar a eles a notícia de que aquela lesão parecia ser um tumor maligno e que, para maiores esclarecimentos, seria feito um estudo imunohistoquímico. Mudei de cidade, sem saber desses detalhes. Meus pais e irmãos optaram por não me comunicar nada daquilo por enquanto. Preferiram esperar a confirmação do diagnóstico e, assim, me poupar de um sofrimento que cedo ou tarde chegaria impiedosamente. Comecei meu cursinho, feliz, crente de que, no final do ano, eu seria mais uma entre milhares de vestibulandos. Ledo engano. Estava adorando a experiência de morar fora de casa... sentir aquela sensação de liberdade, poder ir e vir e, aos poucos ir conquistando minha independência. Mas nem tudo saiu como eu havia planejado. Dois meses depois das lâminas terem sido enviadas para São Paulo, o diagnóstico final chegou, estremecendo não só minha vida, como a de todos que me cercavam. E no feriado de 7 de Setembro, quando fui visitar meus pais, também foi comunicada a mim a notícia mais avassaladora, mais assustadora, mais temida, menos imaginada... é câncer! Eu tinha um Osteossarcoma de Pequenas Células na mandíbula, um tumor ósseo de pequena incidência nessa região. Para ser sincera, não há palavra suficiente para expressar o sentimento de uma pessoa que recebe uma notícia dessa. Não há nada capaz de suavizar esse choque. Não há lágrima que se contente em ficar guardada. Não há coração que não dispare. Fiquei dias e mais dias tentando assimilar esse drama e, por vezes, acordei no meio da noite assustada, querendo acreditar que tudo não passava de um pesadelo... dos piores possíveis. Mas um tumor não perdoa processos de autoconvencimento demorados. Era preciso não dar chances nem moral ao inimigo... e então só me restava uma estrada, uma única estrada: viver tudo aquilo que a vida me propunha, com coragem ou não, com força ou não, com esperança ou não. Sem meio termo.


Continuo a contar essa história no próximo post.
Bjo, bjo, bjo.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Começando...

É impressionante como um jovem já pode ter vivido uma eternidade. Foi essa a impressão que tive da minha vida quando soube que estava com câncer. Olho para dentro de mim e vejo passar um lindo trecho do Manuel Bandeira: "Quando vi Teresa de novo, achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo. Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse.". Descobrir que você tem uma doença grave é ter por um minuto a real sensação do que é estar vivo. É querer acreditar que tudo não passa de um péssimo engano. É deitar numa cama fofinha e desejar ficar lá para sempre... Foi assim que me senti quando as palavras fatídicas deixaram de ser uma suposição para se tornarem realidade nua e crua: é câncer! Receber uma notícia dessa tira o chão de qualquer pessoa. Escutar pela segunda vez é ainda mais assustador. Há cinco anos fui diagnosticada com osteossarcoma de mandíbula e há 3 meses trato de metástases desse mesmo tumor na coluna vertebral. Nunca tive a pretensão de escrever um blog sobre esse assunto, mas para quem acredita em destinos: maketub! Resolvi criar esse espaço para falar sobre esse momento delicado da minha vida e, quem sabe, poder ajudar quem passa pelo mesmo problema. Também para dar notícias a quem está longe, extravasar, relatar medos e, por que não, alegrias. Como já disse, há 3 meses iniciei um novo tratamento. Infelizmente, não tive disposição para começar a escrever essa história assim que surgiram os primeiros fatos. Por isso, farei algumas postagens retrospectivas com o intuito de colocá-los a par dos caminhos que me trouxeram até aqui.




Bjo, bjo, bjo.