sábado, 16 de junho de 2012

Um presente...

Bom, já que a semana foi de muita poesia, aqui vai uma... essa eu ganhei da minha amiga e colega Natalie e achei liiinda... hehehehe! Obrigada, Nath. Somente pessoas com sua sensibilidade e carinho podem fazer isso. Vou guardar para sempre.



(Dedico este poema a Renata Cambuy, à sua família, à sua fé.)

Oi menina , quão pequena sois
Para tanto saber e em tão pouco tempo
Tanto ter que aprender nesse longo momento
Em que tivesses , por força das circunstâncias
Que se ausentar dessas crianças
Que somos todos nós.

Para você menina, nunca dei um presente
Então percebo o quanto amo as palavras
Pois através dessas simplórias e sonoras dádivas
Posso ousar, ao menos tentar expressar
O que talvez os seus mais próximos não puderam falar
dessa explosão de sentimentos que há na gente.

Todos nós, engatinhando no terreno da medicina, exaustivamente,
Plantando , regando, nos empenhando
Em sermos melhores médicos, sonhando...
Às vezes tanto, que nem percebemos
O convite da vida , para aproveitarmos e aprendermos
Com todos que a nossa volta, algo sempre nos ensina, mesmo que involuntariamente.

Tolice achar-nos maduros demais para tudo
Quando a época da colheita ainda nem chegou
E mesmo que tivesse chegado , aqui estou
Para dizer que sempre haverão novos terrenos para serem plantados
E valorizar isso é irrelevar as sementes ruins que ficaram no passado
E perceber que todos somos aptos para dar frutos.

Na metáfora da vida, menina,
Você apenas trocou de lugar no consultório
De médica a paciente , não se assuste com o repertório:
Anamnese, exame clínico, propedêutica , cuidado, zelo.
E o que mais nos intriga nesse hemisfério
É que a vida não tem um algoritmo nem protocolos para cada situação.

Só quero que saiba que ao voltar
Quero recebê-la e ser contagiada por esse encanto
Essa força, brio e capacidade de mostrar de um jeito brando
Quão mesquinhos são os detalhes
Quando se pode aproveitar mais e mais
Dos alguéns ao nosso redor, e o que cada um pode nos acrescentar.

Se pudéssemos desapegar dos pré-conceitos
Das autoregras, dos prós e contras
E apenas olhar, apenas conhecer, admirar-se e perceber
Cada vez mais nos surpreenderíamos, quão humilde e sofisticada é a Sabedoria Divina
Que só faz morada naqueles que não se acham dignos dela.

Quero poder ouvir suas histórias, suas conquistas
E sorrir e chorar com todas elas,
E comemorar e aprender com todas elas
E perceber que, não importa que não se forme conosco
Pois , na Universidade da vida
Já és Doutora antes de nós!




Bom final de semana a todos.

Bjo, bjo, bjo.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Poesia numa hora dessa?

Peguei emprestada a expressão que Luiz Fernando Veríssimo usa na apresentação dos seus poemas para começar a falar de uma coisa que me parece emergencial neste momento: poesia. Sim... poesia, apesar de tudo levar a crer que agora não é apropriado. Depois do MTX, da Doxo, do planejamento da radioterapia, de mais uma rebelião das minhas mucosas, depois dos conflitos psicológicos, francamente: poesia numa hora dessa?
Vou explicar... andei estressada e chateada com uma sequência de acontecimentos que, por vezes, pareceram pesados demais para mim. Situações que não envolviam somente minha vida e meus dramas, mas de outras pessoas também. Maio foi um mês de perdas e despedidas e Junho chegou igualmente assim: levando para o horizonte pessoas que, em resumo, foram muito importantes. Nesse tempo, entre o choque de uma notícia e outra, fiquei procurando algo que pudesse ir preenchendo as lacunas deixadas pela saudade e também uma forma de driblar tantas dúvidas que batem no nosso coração. Independente de qualquer coisa, o diagnóstico de um câncer nos coloca no mesmo patamar... ele nos iguala de uma forma tão real que é impossível alguém se sentir em posição privilegiada ou achar que está livre da dor ou da própria morte a qualquer momento. Confesso que ultimamente tenho ficado abalada com isso tudo e me perguntado se tenho vivido e amado como deveria ou se tenho me perdido nesse mar de emoções que se transformou minha vida. No entanto, ironicamente, a morte pode nos ensinar a viver melhor.
Mas e a poesia, onde fica neste post? Nessa semana recebi uma avalanche de poemas. Não sei se foi coincidência ou providência do destino, não sei se tenho pessoas sensitivas demais ao meu lado a ponto de sentirem, mesmo de longe, que estou precisando de alento, não sei o que foi... só sei que me fez bem. 
Ainda estou "quebrada" em função das bolsinhas avassaladoras da Doxo e, por isso, meus dias têm sido mais tranquilos, sem muito esforço físico. Tenho lido coisas muito legais: Drummond, Lispector, Cora, João Cabral de Melo Neto e por aí vai... E, sem sair da minha casa, posso ir a lugares lindos, refletir, sonhar e acreditar que, de fato, tudo nessa vida passa. Estar em contato com isso tudo tem me ajudado a afastar sentimentos que não nos levam a lugar algum, nem à própria reflexão sadia sobre a vida e o que há de mais sublime nela.
Ler um poema. Escutar um poema. Falar um poema em voz alta. Perceber seu ritmo, sua música, sua comunicabilidade. E se lhe falta talento para transformar qualquer verso em algo fácil e acessível ou se você acha que poesia é coisa de gente intelectual e chata, experimete também e veja como essas pequenas coisas podem transformar seu dia.
No entanto, não encontramos poesia apenas nos livros ou nas palavras exatas... percebi que, na maioria das vezes, a melhor parte da poesia está justamente atrás daquilo que foi escrito, na entrelinha, ali, bem clandestina, fazendo jogo de esconde-esconde com sua alma, numa brincadeira que te leva a lugares desconhecidos, porém essenciais. Para mim, tem sido assim.
Onde mais podemos encontrá-la? Perto. Ao regar as plantas do jardim. Ao selecionar fotos para o porta-retrato. Dando uma caminhada no campo aberto, sentindo o cheiro da natureza. Escolhendo um vestido para almoçar com a amiga. Procurando objetos para a  casa conforme uma lembrança especial. Recebendo cartinha com flor de Jasmim.
Podemos, ainda, encontrá-la reverenciando o sol da manhã depois de uma noite de chuva. Encantando-se com o que é belo. Quando não conseguimos mais sentir prazer com certas trivialidades, nada que viermos a conquistar será suficiente, pois teremos perdido a noção do que a palavra suficiente significa. Sei que isso tudo parece fácil e que não é, mas se o primeiro passo não for dado, se a cortina de ferro entre essas realidades não for rompida, muito pouco vamos poder levar dessa nossa viagem pela vida.
Independente de religião ou crença, acredito que o que sustenta nossa existência passa pelo cultivo de um espírito de gratidão, sem penitências, culpas e outras tranqueiras. Gratidão por estarmos aqui e termos uma alma capaz de detectar o sublime no essencial, fazendo com que todo o supérfluo, que não é pecado desejar, torne-se apenas uma consequência agradável desse nosso olhar íntimo e amoroso a tudo que nos cerca.



Para terminar, deixo um poema lindo que me foi apresentado...

Dá-me a tua mão
Dá-me a tua mão:
Vou agora te contar
como entrei no inexpressivo
que sempre foi a minha busca cega e secreta.
De como entrei
naquilo que existe entre o número um e o número dois,
de como vi a linha de mistério e fogo,
e que é linha sub-reptícia.

Entre duas notas de música existe uma nota,
entre dois fatos existe um fato,
entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam
existe um intervalo de espaço,
existe um sentir que é entre o sentir
- nos interstícios da matéria primordial
está a linha de mistério e fogo
que é a respiração do mundo,
e a respiração contínua do mundo
é aquilo que ouvimos
e chamamos de silêncio.

Clarice Lispector

Mas logo agora que a bruxa está solta por aí, logo agora que perdi uma grande amiga, logo agora que os políticos andam perdendo as estribeiras e lavando a roupa suja no plenário, eu venho falar de poesia?
Pois é, pareceu-me bastante oportuno.
Fiquem em paz!
Bjo, bjo, bjo.