terça-feira, 9 de julho de 2013

Um ano de remissão

A notícia que pesava uma tonelada veio numa manhã de terça-feira, em um telefonema que escondia todo o meu futuro e o da minha família. Daquele dia em diante, os medos insuportáveis se transformaram em coragens arrebatadoras. Eu tinha uma vida inteira pela frente e o diagnóstico da recidiva de um câncer só me deu uma opção: ser corajosa. Então me vesti com as roupas e as armas de Jorge. Quem acorda em um hospital sabe que o relógio ali é regido por outro fuso. O mundo branco é isolado por muros de desejos diferentes. Um sonho de padaria tem um gosto capaz de te transportar para uma cafeteria de Paris. Um aperto de mão confiante de um enfermeiro é tão valioso quanto o resultado de um aguardado exame. Ali eu era paciente. Em todos os sentidos. Posso ter doado meus braços, meus cabelos, minha faculdade, mas a vitória é de todos que me amam. A força, de todos. A sintonia, de todos. O mistério, de todos. Venci minha missão com a bravura da mulher maravilha e ganhei o super poder de olhar a vida em outros dimensões. Fiz promessas, projetei vontades e fechei acordo comigo mesmo. Do lado de fora, não sei bem o nome do que eu, meu pai, minha mãe, irmãos e amigos fizeram, mas foi intenso. Olhares que diziam mais do que discursos inteiros. Mas tudo foi um momento ímpar de aprendizado. Quem foi que disse que só crescemos nas alegrias? Exatamente hoje completo 365 dias de remissão. Um ano se passou e tudo está ficando como uma lembrança cicatrizada. Não fossem as circunstâncias da vida e suas coincidências mágicas, talvez não estivesse aqui escrevendo. Ontem fui apresentada a uma outra garota, com história parecidíssima com a minha... ela estava vivendo a angústia da primeira quimioterapia e da queda iminente do cabelo que é sua marca registrada. E agora, lembrando essa menina, me pergunto: por que tanta alegria depois dessa tempestade louca? É preciso atravessar esse tsunami para que a gente chegue ao outro lado do rio com esse sabor de vida ganha? Nunca procurei entender o verdadeiro sentido da vida. Tem gente que já nasce sabendo o que vai ser quando crescer. Tem gente que já nasce e encontra caminhos perigosos. Tem gente que tenta desviar mas é destinado a passar por provações. Prefiro pensar que somos pessoas de sorte. Que tiveram suas histórias grifadas com caneta marca texto, lá do alto das nuvens, pra refletirem um pouco de magia para quem quiser assistir. Talvez por medo, talvez por fatores aleatórios, fomos escolhidos. E hoje só posso agradecer. Por ter tido a imensa honra de nascer na família que mais me encheu de orgulho. Naquela que mexe com meus mais profundos sentimentos... que me faz lembrar que depois da guerra, há flores. Aquela notícia surpreendente podia ter nos levado ao coma generalizado. Mas nos fez voar de paraquedas. Ver a vida de lá do alto. Repensar problemas. Desistir de bobagens. Ignorar o indiferente. Ser feliz já não é uma questão de escolha. É obrigação.


Bjo, bjo, bjo.

6 comentários:

  1. Amei! E tenho certeza que daqui a pouco estarei fazendo o mesmo! :) bjos. Deus te abençoe. Emília Tainah

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    1. Oooii, Emília! Que seja bem-vida sua remissão! uhuu... hahaha!
      Bjo grande e obrigada pelo carinho.

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  2. Boa noite Renata ... navegando pela net na busca de informações e experiências sobre este universo a parte chamado "câncer", me deparei com o seu espaço e depois de muito explorá-lo decidi pousar aqui neste comentário.
    Sempre gostei de participar do mundo das pessoas, sempre me interessei e sempre aprendi muito com estas "viagens", ainda que pelo sofrimento, o qual é a ferramenta que mais nos molda e agrega valores, de dentro para fora e de nós para todos.
    Só que agora o quadro é muito próximo de mim e estou com muito, muito medo.
    Minha cunhada perdeu o filho de 21 anos em um acidente de carro no dia 22 de maio de 2013.
    Exatamente no dia 26 de Junho, após um mês do falecimento, ela foi em uma consulta e tudo indica que ela esteja com câncer de mama.
    Desde o mesmo de janeiro deste ano ano que ela percebeu alterações, e por conta disso eu acredito que já esteja adiantado, entende ?
    O mamilo dela retraiu, o seio está completamente deformado, com um tumor considerável e vários outros completamente perceptíveis.
    A mamografia mostrou nódulos na outra mama e ela tbm percebeu embaixo do braço.
    A médica foi clara e antes do resultado da biópsia feita por punção ela já adiantou que é maligno.
    Minha cunhada retornará no dia 31 já com os resultados e quais serão os primeiros passos que ela terá que dar nesta luta.
    Me perdoe o desabafo, mas ninguém melhor do que quem passa por estas avalanches de sentimentos e emoções para entender o que a família está passando neste momento.
    Desejo-te tudo de bom e que o que vc mais deseja, floresça!
    Elaine Cristina

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    1. Olá, Elaine Cristina! Que surpresa boa entrar no blog e achar seu comentário. Adoro quando posso "conhecer" alguém por aqui. É sempre um prazer. Bom... concordo plenamente com vc: o sofrimento nos molda e agrega valores. Vivemos nessas idas e vindas da vida e todo dia e qualquer situação pode nos ensinar a caminhar melhor. Mal posso imaginar a dor da sua cunhada... dizem que perder um filho é a maior dor do mundo. E como se não bastasse isso, um tumor ainda. Mas se tem uma coisa q aprendi é q não passamos por nada por acaso. E aquilo que está escrito e proposto para nós, ninguém pode tomar do nosso destino. Que a sua cunhada seja forte e fiel à sua fé. Ela com certeza precisará muuuito de todos vcs. E tenham a certeza de que umas das melhores quimioterapias do mundo é o amor. Alto poder de cura. Fiquem em paz.
      Bjo grande.

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  3. Renata que benção estarmos em remissão não é? Eu assim como vc estou tb há quase 3 anos. sabemos que não é fácil, mas com fé vamos vencendo!!! Um grande abraço!!!

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    1. Amém, Cristina! Que venham muitos e muitos anos de remissão para mim, para vc, para todos nós!

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