Desde que resolvi escrever este blog, tenho recebido inúmeras manifestações de carinho. Não que antes isso não acontecesse, mas agora é diferente... pessoas que nem conheço me enviam mensagens incríveis, seja por aqui, pelo Facebook, e-mail ou celular. Um mar de emoção invadiu minha vida, num movimento que, antes de mais nada, traduz o quanto precisamos uns dos outros.
Em diversas ocasiões, muitas pessoas comentaram sobre minha força, coragem, alegria, determinação, como se tudo isso pertencesse a mim. Mas não. Eu não sou essa guerreira. Nesse tempo, descobri que guerreiros de verdade são aqueles que lutam sem armas nesta batalha épica pela cura. Guerreiros são os que, embora estejam tendo resultados decepcionantes com o tratamento, estão lá, insistindo e acreditando mesmo quando a medicina diz o contrário.
Fortes são as famílias que, apesar dos poucos recursos financeiros, abandonam seus lares e se abrigam em pensões, hotéis ou casas de apoio, sem privacidade e conforto. Corajosos são os pais que se demitem de seus empregos e passam a depender dos projetos assistenciais do governo. E que a verdade seja dita: para se conseguir algum benefício, os trâmites são tão burocráticos que muitos desistem no meio do caminho. Além disso, o que o governo oferece é tão irrisório que dá vergonha de mencionar o valor e de viver num país em que uma doença tão grave é tratada com tanto descaso. Batalhadoras são as mães que conseguem cuidar de um filho doente e, ainda assim, dar conta dos que estão sadios, mas precisando de cuidados.
Guerreiras são as crianças incríveis que tenho conhecido. Meninos e meninas que mal começaram a viver e já se depararam com um desafio desse. E mais: com um sorriso largo no rosto, apesar das furadas, das dores, dos exames chatos, da quimioterapia. Poucos adultos conseguem lidar tão bem com problemas tão sérios. Qualquer coisa serve de motivo para deixar de dar um bom dia sincero e ser gentil com os outros. Lamentável é constatar, ainda, que muita gente fica aí reclamando de coisas tão banais e pequenas, como se fossem os mais sofredores do mundo.
Por isso, digo com toda propriedade: não sou um exemplo a ser seguido, não sou a fortaleza que muitos imaginam que eu seja. Tenho uma família fantástica, que faz de tudo para meus dias serem mais amenos. Meus amigos são os melhores que eu poderia ter... Tenho todo o conforto possível, não preciso acordar às 3 da manhã para não perder o "favor" da ambulância, recuso o almoço e o lanche do hospital porque sei que minha mãe compra coisas gostosas que meu estômago aceita. Ganho presentes, passeio, viajo, tenho mais que uma equipe cuidando de mim: tenho um exército que me escolta nessa batalha infame, não me deixando sofrer pelo evitável. Entre outras, posso dizer que minhas dificuldades até agora se resumem aos efeitos deletérios da quimioterapia. No mais, não tenho o direito de me lançar no muro das lamentações. Não vou ser hipócrita e dizer que estou vendendo felicidade, mas também não posso ser ingrata a ponto de me sentir a coitadinha. Definitivamente, esse é um comportamento incabível nessa situação.
Tenho plena convicção de que fortes são as pessoas isentas disso tudo, mas que são curadas, são alegres, são um exemplo de superação. Coisa para nenhum medalhista olímpico colocar defeito. Eu sou só mais uma que tem oportunidades num país em que a maioria sofre pela escassez de recursos que garantem a mínima qualidade de vida.
Sinto um orgulho imenso de ter conhecido verdadeiros heróis. Todos os dias, eles me dão lições que carregarei para além vida, lições essas que não quero apagar da memória daqui um tempo.
Esses dias conheci um casal que perdeu o filho há uns 3 meses por causa de uma leucemia. Quando vi aqueles pais no hospital, logo perguntei o que eles faziam naquele lugar que trazia tantas lembranças ruins. Mas fiquei extremamente envergonhada comigo mesma com a resposta: eles estavam ali para divulgar um trabalho maravilhoso que fazem antes mesmo de perder o filho. Aqueles pais fundaram uma ONG com o intuito de ajudar quem precisa. Senti que aqueles dois, ali na minha frente, eram muito melhores que eu. Durante esse tempo de GRAACC, fiz muito pouco. Palavras lindas, tarde de princesa para uma amiga, brigadeiro e pipoca são um nada perto do que muitos precisam. Por isso, comecei a entender que é fácil ajudar dando um telefonema, mandando mensagem via internet ou telefone. Difícil é sair do conforto do seu lar, acordar cedo, abrir mão de parte do salário, superar a dor de perder um ente querido distribuindo amor. E falo mais: apesar de serem poucos os que abrem mão disso tudo, são esses que fazem não só da oncologia, mas do mundo, um lugar mais agradável de se viver...



"Quando era jovem tentei me matar várias vezes, mas aí percebi que cuidar do próximo é a melhor forma de esquecer os próprios problemas e, melhor ainda, se isto for feito com muito bom humor e principalmente amor."
Patch Adams
Inspire-se!
Bjo, bjo, bjo.