segunda-feira, 5 de março de 2012

Aconteceu comigo!

Depois da dose sagrada de morfina no hospital, a dor nas costas finalmente foi controlada. Como havia dito, a suspeita inicial foi a de que um cálculo renal teria provocado tamanha dor... mas lá dentro de mim, eu não acreditei muito nessa hipótese. Já tinha história de cálculo renal e nunca senti nada parecido. Era muito diferente...
Na segunda-feira, a tomografia estava marcada. Não era novidade fazer um exame desse, mas eu estava ansiosa, tensa, preocupada. Ninguém tirava da minha cabeça que aquilo não era uma cólica renal. Fiz a TC na clínica da minha professora de radiologia e, ironicamente, uma semana antes, eu estava ali, do outro lado da sala, observando alguém fazer o exame. O mundo dá muitas voltas mesmo...
No final do procedimento, Simone, radiologista super top (mereço 10 na prova, tia Si... hehehe), falou que eu realmente estava com muitas pedrinhas nos rins... umas 13 somando tudo. E não disse absolutamente mais nada, nem tão pouco demonstrou qualquer preocupação. Só marcou o dia de pegar o resultado final mesmo. Fui para casa, mas com uma sensação muito ruim, que não sei explicar direito. Menos de uma semana se passou e o resultado da tomografia já estava pronto. Era pegar as imagens e o laudo e beber muita água para eliminar esses cálculos (doce ilusão!).
Era uma quinta-feira e eu já tinha pedido meu pai para passar na clínica e pegar a TC depois do trabalho. No entanto, notei minha mãe estranha desde cedo nesse dia... achei que poderia ser qualquer tipo de preocupação, mas nunca imaginei que aquele "olhar triste e distante" era, na verdade, olhar de preocupação diante da intimação que ela tinha recebido há pouco tempo. Simone tinha ligado e pediu que fôssemos eu, meu pai e minha mãe buscar o resultado do exame... que ela gostaria de conversar conosco no final da tarde. Até pouco tempo antes do encontro, eu não sabia de nada... tinha tido um dia corrido, com muitas aulas e atividades na faculdade. Porém, quando me falaram isso... meu Deus! Senti um frio tão grande na alma que é impossível descrever aqui.
Fiquei desnorteada com essa notícia... algo não muito bom estava prestes a acontecer, eu pensava. Mas, ao mesmo tempo, procurava ser otimista, tentando não antecipar qualquer sofrimento. Fomos para a clínica e, no caminho, não conseguimos falar nada um para o outro. Um silêncio absurdo tomou conta do carro e das nossas vidas naquele momento. Chegamos em silêncio também e, enquanto esperava Simone nos chamar, fiquei observando o movimento dos pacientes, sem saber que, em pouco tempo, eu seria mais uma a frequentar clínicas e hospitais novamente.
Não sei dizer, com exatidão, quanto tempo ficamos ali esperando, contudo os minutos eram pesados demais para mim... um segundo teve a equivalência de uma hora. Por fim, fomos chamados... a sala em que seríamos atendidos ficava quase no final do corredor... e era justamente a sala em que eu vivi momentos de alegria há poucos dias nas aulas de radiologia. O corredor ficou longo e teve uma hora que pensei que não teria pernas para chegar até a sala, tamanho era o medo de escutar algo que não queria.
Respirei fundo e, assim que abri a porta, vi no negatoscópio um monte de imagens... só consegui exergar isso na minha frente. Mas Simone nos recebeu super bem... tranquila. Pediu que entrássemos, nos acomodou e conversou sobre outras coisas antes de tocar no assunto que tinha nos levado até ali. Contudo, eu não tirava o olho das imagens, não conseguia me concentrar em mais nada. Àquela altura, eu já tinha certeza de que não se tratava somente de cálculos renais. Algo muito pior estava por vir.  Acho que fiquei sem respirar o tempo todo em que permaneci naquela sala. Sentei numa cadeira bem próxima às imagens e meus pais mais atrás. E, assim que Simone ligou a luz do negatoscópio e começou a falar, meu coração disparou e minhas mãos começaram a tremer. Senti meu coração bater na garganta quando percebi algo estranho na coluna em um filme que estava mais próximo... Olhei para trás e vi meus pais super apreensivos também. Na verdade, não sei quais foram as primeiras palavras de Simone, mas me lembro quando ela disse que haviam encontrado, além dos cálculos, uma alteração em uma vértebra lombar.  E, assim que ela colocou o laudo em cima da mesa, mesmo de cabeça para baixo, consegui ler as primeiras palavras: "considerar hipótese de metástase de osteossarcoma...". Fechei os olhos, segurei as lágrimas e comecei a escutar a sentença: "Renatinha, você tem uma lesão suspeita na segunda vértebra lombar... as características da imagem não são ruins, mas você tem um histórico de tumor nos ossos e, para sua segurança, aconselho você procurar seu oncologista para melhor avaliação." Buuuuuuuum... não senti o chão, tive a impressão de que tudo desmoronou na minha frente, as coisas começaram a ficar escuras, girar... O choro saia fácil. Um sentimento horrível, que não desejo para ninguém. Simone não olhava para mim, mas para meus pais. Quando virei para trás, vi os dois chorando também. Receber uma notícia dessa não é fácil, mas também dar uma notícia dessa deve ser terrível. Lembro de Simone me dizendo palavras carinhosas e de ter sido amparada, mas não me lembro exatamente do que ela me disse naquela hora. Só sei que ela foi a melhor pessoa naquele momento nefasto.
Aquilo foi um soco no estômago... não conseguia falar quase nada... e, para ser sincera, nem sei se pronunciei algo. Não sei como consegui sair da sala andando, não sei se me despedi de Simone, não sei se agradeci o carinho que ela teve por mim, como conseguimos chegar no carro... Eu não conseguia pensar em quase nada... aquela notícia tinha me tirado a razão. Minha vontade era de chorar, de gritar, de fugir... de morrer repentinamente! Mas como fugimos de um problema desse? Nem se desejássemos ignorar, conseguiríamos... Voltamos para casa e, até hoje, não sei como meu pai conseguiu conduzir o carro. Minha mãe tentava enxugar as lágrimas, mas elas saiam dos olhos muito mais rápido. O caminho ficou muito mais longo e triste... Se fomos calados para a clínica, voltamos ainda mais mudos. Não tinha palavra certa. Não tinha consolo. Não tinha nada que pudesse diminuir a dor daquele momento. Confirmação de que era uma metástase, só com a biópsia mesmo, mas apenas o fato da possibilidade existir já era motivo suficiente para um desespero assustador...



E agora? Como assimilar uma notícia dessa? Como entender que você está, mais uma vez, protagonizando uma história que ninguém quer viver?

Bjo, bjo, bjo.

8 comentários:

  1. Amiga, que post emocionante.
    Uma cena muito triste mesmo na sua vida e dos seus pais, mas pode ter certeza que bons tempos estão por vir.
    Amamos vc e estamos com saudade.
    bjooos

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  2. Vc vai vencer essa guerra sim... Sim ... tenho certeza disso...
    Será uma médica maravilhosa e vou continuar seguindo essa sua história e admirando a sua facilidade para escrever e comover a gente! CONVERSE AI COM SEUS SOLDADINHOS DO SISTEMA IMUNOLÓGICO E MOSTRE QUEM É A CHEFE... oK? BJS

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  3. A vida e seus inusitados....assim como vc eu quis fugir quando descobri o ca, mas para onde? Não tem jeito mesmo, agarramos nas mãos de Deus e depois do susto seguimos e tenho certeza que você é uma lutadora e sairá dessa e muito mais forte! To na torcida! Um abraço!

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  4. Acho que nunca mais terei a pretensão de entender...
    Apenas de 'viver'.Um beijo.

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  5. "Pessoas habitadas são aquelas possuídas por si mesmas, em diversas versões. Estão preenchidos de indagações, angústias, incertezas, mas não são menos felizes por causa disso. Não transformam suas 'inadequações' em doença, mas em força e curiosidade. Nâo recuam diante de entrecuzilhadas, não se amedrontam com transgressões, não adotam opiniões dos outros para facilitar o diálogo. São pessoas que surpreendem com um gesto ou uma fala fora do script, sem nenhuma disposição para serem bonecos de ventríloquos. Ao contrário, encantam pela verdade pessoal que defendem." (Martha Medeiros)

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  6. Nó na garganta, lágrimas nos olhos, aperto no peito... E o coração cheio de ternura!

    Lembrei-me de uma vez que estava na sua casa e tinhamos uns 9 anos mais ou menos. Você não havia ido bem em uma prova no colégio ou não havia feito tarefa, não me lembro bem, daí sua mãe teve uma conversa séria com você na minha presença, eu até quis ir embora, mas ela disse que era prá eu ficar... No inicio não entendi o motivo da minha presença ali... Mas concluindo tudo desse dia e de tantos outros, sentia o quanto Tânia era protetora e maternal com todas nós, que os conselhos que eram para vocês filhas serviam para nós também... Ela cuidava e participava das nossa brincadeiras e sonhos de meninas rsrsrs!

    O nó, as lágrimas, o aperto e a ternura desse comentário é dedicado ao sentimento de mãe que no nosso íntimo de mulher está ali guardado quando ainda não somos e vividos naquelas que são e buscam o melhor nesse papel.

    Força, fé e muitas alegrias para você Tânia que, com certeza, é o porto seguro dessa escritora/blogueira maravilhosa!

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  7. E essa sua capacidade de nos tocar sempre a cada post? Ô Rena, tô aqui super emocionada de relembrar (só que dessa vez a partir da sua ótica) essa trajetória tão difícil, dolorosa, e angustiante...

    Você tem muita história pra contar, menininha, e ainda nos dará muitos motivos para nos emocionar, sorrir, ter lembranças gostosas e desejar te rever logo...

    Que Deus te abençoe e te guie, meu bem... Queria tá do seu lado, mas já te disse que mesmo de longe a torcida de todo mundo por aqui é forte!!

    Força, Rena's! Força, leucócitos!

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  8. FOrça Renata ....DEUS é maior .....o amor vence todas as batalhas ....

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